Custa-me a entender tamanha celeuma em torno das declarações do presidente da FIFA.
Para tudo isto contribuiu uma imprensa que mais não fez do que recorrer ao sensacionalismo mais primário para tentar (e conseguiu) criar uma onda de indignação e fazer do Cristiano Ronaldo uma vítima dos tentáculos da FIFA... Algo me diz que os nossos amigos Hugo Gilberto e Nuno Luz andaram por detrás disto.
Estive a ver o vídeo completo da parte da entrevista em que Blatter é instado a opinar sobre se preferia Cristiano Ronaldo ou Messi. A imprensa retirou as seguintes expressões:
"Messi é um bom rapaz e toda a gente gosta dele";
"O outro é como um comandante num campo de batalha", seguida de uma pequena encenação "militar";
"[Cristiano Ronaldo] gasta mais dinheiro no cabeleireiro";
"Prefiro Messi".
Mas se virmos com atenção todo o vídeo...
Em relação à primeira afirmação acho que todos estão de acordo.
Depois, eu sempre pensei que chamar um homem de "comandante num campo de batalha" era elogiar a sua capacidade de liderança. O suíço acrescenta que "é bom para o futebol ter jogadores com essa capacidade de liderança". Que humilhação!
Em relação ao dinheiro no cabeleireiro, Blatter termina a frase dizendo "mas isso pouco importa". Porque será que isto foi omitido?
Finalmente, termina dizendo "Adoro os dois, mas prefiro Messi". E se preferisse o Cristiano Ronaldo? Já não era escandaloso?
Ninguém gosta de Blatter, porque por definição ninguém gosta da FIFA ou da UEFA. Mas aquilo que se passou em Oxford está muito longe de ser uma humilhação, um assunto de Estado ou uma injúria à nação lusitana, de tal maneira que leve a petições, declarações políticas, e, quem sabe, concertos de homenagem, peditórios públicos ou manifestações.
Este assunto recorda-me o caso das caricaturas de Maomé que foram publicadas por um jornal dinamarquês aqui há uns anos e que levaram a que todo o Islão ameaçasse os autores das caricaturas e por extensão a Dinamarca e todos os seus aliados, sob o pretexto de ofenderem os dogmas religiosos. Aqui passa-se a mesma coisa: Cristiano Ronaldo é sagrado, e só os portugueses é que o podem satirizar.
Também se enfatizou o facto de Blatter se ter referido ao madeirense como "o outro". Na minha opinião, eu acho que o problema de Blatter ter falado em inglês (e eu acho que ele nunca se sentiu muito à vontade nisso) levou-o a perder o fio à meada no seu discurso. Disse "o outro", talvez pensando que se tinha referido a Messi como "Um", em vez de o ter tratado pelo seu nome próprio.
Nas palavras de um político qualquer português, Blatter teria tido uma declaração "infeliz", assim semelhante a Rui Machete.
Eu disse político qualquer português. Acho que sabem de quem estou a falar (é a terceira figura do Estado, a seguir ao Presidente da República e à presidente da Assembleia da República). Mas não disse o nome dele, apenas usei deliberadamente a expressão "um político qualquer português". Acabei de ser mordaz.
Mereço que a bancada do PSD apresente um voto de protesto contra mim
Mereço que haja petições na internet a pedirem que me despeçam do meu trabalho.
Com isto tudo Cristiano Ronaldo acaba por sair a ganhar.
Se vencer a Bola de Ouro, ganhou-a apesar de Blatter; se for Messi, lá vão dizer que é culpa de Blatter e se não for nem um nem outro as coisas arranjaram-se para não ofender ninguém.
Toda a gente sabe que Lionel Messi e Cristiano Ronaldo são dois ases da história do futebol. A questão é que o futebol é um jogo colectivo, e o palmarès dos dois ao serviço das suas selecções nacionais cifra-se num Campeonato do Mundo de sub20 e numa medalha de ouro nos Jogos Olímpicos para Messi e nada para Cristiano Ronaldo. Nas selecções absolutas, nem um nem outro foram campeões do Mundo ou continentais.
Ponho-me a pensar se às vezes não querem fazer deles o Tsubasa Ozora / Oliver Tsubasa / Oliver Atton e o Kojiro Hyuga / Mark Lenders transpostos para a realidade. Um trata a bola como "sua amiga", o outro tem a vontade férrea de vencer (e tem mesmo; apesar da vaidade que demonstra, Cristiano Ronaldo prova e provará sempre que com uma bola nos pés tudo o resto é nada).
Nos desenhos animados, eles praticamente faziam tudo sozinhos. Mas o futebol a sério é diferente. São onze contra onze.
O futebol joga-se nas quatro linhas. Não se joga na imprensa.
Vivam Lionel Messi e Cristiano Ronaldo.
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